- Entre - sugeriu sem convicção.
- Não, obrigado. São horas de recolher à base.
Rodeou a ponta de lança com os dedos, pareceu na iminência de transpor os degraus, mas não se moveu. Desconfortavelmente, olhando à distância, por cima da cabeça de Gordon, arriscou:
- Não se ofende se lhe disser uma coisa?
- O quê?
- Fiquei impressionado com o que me contou sobre a sua pequena. Não ter possibilidade de a levar a parte alguma, etc. Deve ser horrível.
- No fundo, não tem importância.
Quando ouviu Ravelston empregar o termo « horrível », Gordon compreendeu que exagerara e arrependeu-se de se ter exprimido daquele modo imbecilmente autocomiserativo. Uma pessoa diz essas coisas com a sensação de que não o pode evitar e depois arrepende-se.
- Confesso que exagerei - acrescentou.
- Olhe, deixe-me emprestar-lhe dez libras. Leve a moça a jantar fora, algumas vezes. Ou a passar um fim-de-semana no campo. Pode influir beneficamente nas vossas relações. Custa-me pensar que...
Gordon enrugou a fronte com amargura, quase com raiva, e recuou um passo, como sob o efeito de uma ameaça ou insulto. O mais impressionante era que a tentação para aceitar o dinheiro quase o dominara por completo. O que não poderia fazer com dez libras! Acudiu-lhe a visão fugaz de Rosemary e ele num restaurante, com algumas flores no centro da mesa, um empregado atencioso e uma garrafa de vinho tinto coberta de pó num suporte de vime.
- Nem pensar! - declarou.
- Reconsidere, por favor. Eu gostava de lhas emprestar.
- Obrigado, mas prefiro conservar as minhas amizades.
- Não lhe parece uma observação… enfim, burguesa?
. - Julga que as suas dez libras constituiriam um empréstimo? Não poderia pagar-lhe nem em dez anos.
- Também, não me faria muita diferença. - Ravelston desviou os olhos. Acabara por surgir: a detestável, odiosa, confissão que se via forçado a fazer com curiosa frequência. - Tenho muito dinheiro.
- Eu sei. É precisamente por isso que não aceito as dez libras.
- Às vezes, você é um pouco... bem, casmurro.