Numa rua próxima, ecoou o pregão do vendedor de carvão com uma inflexão fúnebre. Faltavam apenas duas semanas para o Natal. Era estupendo estar sem emprego, naquela quadra! No entanto, o pensamento, em vez de o assustar, apenas o enfastiava. A sensação letárgica peculiar e peso incomodativo atrás dos olhos que acodem na sequência de uma bebedeira pareciam ter-se-lhe instalado no corpo permanentemente. A perspectiva de procurar novo emprego aborrecia-o ainda mais do que o espectro da pobreza. De resto, não encontraria trabalho em parte alguma. Não havia empregos disponíveis, nos tempos actuais. Ele mergulharia no submundo do desemprego, para se afundar definitivamente nas entranhas de um asilo, com a sua sujidade, fome e futilidade. E estava sobretudo ansioso por terminar com tudo através da menor publicidade e esforço possíveis.
Ravelston reapareceu por volta da uma da tarde. descalçou as luvas e atirou-as para uma cadeira. Parecia cansado e deprimido, e Gordon compreendeu imediatamente que os seus piores receios se tinham concretizado.
- Ele já sabe, hem?
- Tudo, infelizmente.
- Como? Aposto que a cabra da Wisbeach o procurou e despejou o saco.
- Não. Afinal, vem no jornal. Na folha local. Ele inteirou-se por aí.
- Maldição! Tinha-me esquecido dessa possibilidade. O editor extraiu da algibeira do sobretudo um exemplar dobrado de um bi-semanário.
Era o único jornal que havia na livraria, porque McKechnie incluía nele a sua publicidade. Gordon abriu-o e soltou uma exclamação abafada. O assunto ocupava a página central.
EMPREGADO DE LIVRARIA MULTADO ADMOESTAÇÃO SEVERA DO MAGISTRADO "COMPORTAMENTO VERGONHOSO
Ocupava cerca de duas colunas. Gordon nunca fora tão famoso, nem voltaria a sê-lo. Devia haver escassez de notícias importantes para consagrarem tanto relevo àquilo. No entanto, aqueles jornais locais têm uma noção do patriotismo muito curiosa.