Na montra, porém, viam-se algumas valiosas encadernações de percalina e mapas do século XVI, que Gordon julgou valerem dinheiro. Tudo indicava que Mr. Cheeseman se especializava em livros «raros». Por fim, ele encheu-se de coragem e entrou.
Quando a sineta da porta tilintou, uma criatura de aspecto hediondo, nariz aquilino e espessas sobrancelhas negras emergiu do escritório ao fundo da loja, para olhar Gordon com uma espécie de malícia impertinente. No momento em que falou, fê-lo de uma forma extraordinariamente afectada, como se mordesse cada palavra ao meio antes de a deixar brotar da boca. «Que osso 'zer por si?» foi mais ou menos o que pareceu a Gordon, que se apressou a explicar o motivo da visita. Mr. Cheeseman fitou-o com uma expressão perscrutadora e replicou no mesmo estilo:
- Ah, Comstock, hem? 'enha por aqui. Tenho o 'critório lá atrás 'perava-o.
Gordon seguiu-o, reflectindo que o livreiro era um homem quase tão baixo que quase passaria por anão, com cabelo preto como o azeviche e corpo levemente deformado. Em regra, um anão, quando mal constituído, tem tronco normal e praticamente ausência de pernas. No caso de Mr. Cheeseman, acontecia precisamente o contrário. As pernas tinham o comprimento normal, mas a metade superior do corpo era tão curta que as nádegas pareciam irromper imediatamente abaixo das omoplatas, o que lhe conferia, ao caminhar, o aspecto de uma tesoura.
Possuía os ombros ossudos possantes do anão, mãos grandes quase repelentes e a cabeça movia-se de um modo irreal, por assim dizer. O vestuário' tinha a textura dura e brilhante da roupa muito velha e não menos suja. Estavam quase a alcançar o escritório, quando a sineta voltou a tilintar e entrou um cliente, que tinha numa das mãos um volume da caixa dos de seis pence e na outra uma moeda de meia coroa. Mr. Cheeseman não foi buscar o troco à caixa - aparentemente inexistente -, pois extraiu uma sebenta bolsa das entranhas do casaco e abriu-a com cuidado, como se tentasse evitar que os outros a vissem.