Era esmola que ele pedia, a chorar – de cabelos brancos estacados.
Um dia andara, rondara, a tressuar de aflição.
Todos o repeliam. Era em certa terça aziaga desse inverno enregelado e torvo. Nem andar podia de amargura e cansaço, e via chegar a noite, horas de voltar para casa, onde a mulher o esperava ansiosa:
– Então? então?... Arranjaste?
Oh se o Senhor lhe valesse! se o Senhor que tudo vê lhe acudisse na sua miséria profunda! Nada.
Todas as portas fechadas, todas as almas fechadas a sete chaves. Então, a chorar, aquele velho ridículo e gordo estendeu a mão a um desconhecido que passava, dizendo palavras desconexas. Tinham fome em casa...
E pediu a um, a outro, encolhido, escondido, bebendo as lágrimas, para que lhas não vissem, numa aflição de rachar pedras. Na mansarda as duas esperavam esse triste e amargurado pão, e ele nem dava pelas ruas por onde caminhava com passos incertos, de bêbado. Suplicava num choro humilde, e nessa noite – terça aziaga – se o Gebo ainda tinha vaidade ficou-lhe aos farrapos na lama.
– Então? arranjaste?
– Valha-me Deus! cá está, mulher! cá está!...
Apesar dos ralhos, todos três se queriam de um profundo, de um admirável amor. A desgraça aniquilava-os juntando-os. Deixava um de comer, fingindo-se farto, para que outro tivesse mais pão; se qualquer deles adoecia, os outros nem dormir podiam, e um dia a mulher enfim tombada, inútil, sem poder erguer-se, chamou Sofia para lhe dizer baixinho:
– Olha se cuidas de teu pai. Nunca o abandones.
Foi sempre um santo.
Desde então ninguém mais lhe arrancou palavra.
Com os olhos aguados, seguia-os pela casa, até que ficou morta. Acabou gasta de lutar um dia e outro com a desgraça numa vida de desespero. Ela era o arrimo, a energia, a força que os sustentava a ambos e impelia para a vida; era ela quem disputava – em vão – braço a braço com o destino férreo, tentando ampará-los, e arrancando-lhe os últimos restos de felicidade.