A Brazileira de Prazins - Cap. 7: CAPÍTULO VI Pág. 54 / 202

Um rei é um homem como qualquer homem.

- Credo! Faz muita diferença... Mesmo muita...

Ela descobriu a travessa a rir-se:

- Vossa majestade diz que gosta..

- Sardinhas de escabeche? Se gosto!... Vamos a elas, que estão a dizer - comei-me. E atirou-se às sardinhas com uma sofreguidão pelintra.

Depois, serviu-lhe rodelas de salpicão com ovos. A sua majestade gostava muito destas comezanas nacionais. Já tinha comido tripas, e dizia que no exílio se lembrara muitas vezes desta saborosa iguaria com feijão branco e chispe, que tinha comido em braga. O abade de calvos sensibilizava-se até às lágrimas quando via el-rei a esbrugar uma unha de porco e a limpar as régias barbas oleosas das gorduras suínas. O terceiro prato era vitela assada. A senhorinha trazia - lha no espeto, porque sua majestade gostava de ir trinchando finas talhadas, enquanto a cozinheira, de cócoras ao pé do fogareiro, conservava o espeto sobre o brasido, a rechinar, a lourejar. Bebeu harmonicamente o real hóspede um vinho branco antigo, da lavra de um fidalgo de braga, proprietário do douro, que estava no segredo do ditoso abade de calvos - capelão-mor de el-rei e dom prior eleito de Guimarães.

A criada assistia muito jovial àquela deglutição formidável, e dizia particularmente ao abade: - este senhor, pelo que come, parece que tem passado muitas fominhas! Ninguém há de crer o que a sua majestade atafulha naquele bandulho! - e dizia que lhe dava vontade de chorar, lembrando-se das lazeiras que ele tinha apanhado; porque o abade contava que lera no deus o quer, do visconde de Arlincourt, que o Sr. D. Miguel, em Roma, não tinha às vezes 10 réis do seu para almoçar uma xícara de leite. E, perguntando a el-rei se era verdade aquilo - que sim, que chegara a essa extremidade; mas que preferia a fome a ceder os seus direitos e a felicidade dos seus vassalos pelos sessenta contos anuais que lhe ofereceram da casa do infantado, e que ele rejeitara.





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