CAPÍTULO XII Depois, bem sabem, senhores, como aquele padre rocha despenhou abruptamente o desfecho da farsa, pensando que vingava a moral e punia com degredo o celerado que infamava o sacratíssimo nome de el-rei D. Miguel. No trânsito para a relação, a meia légua, na estrada do porto, o veríssimo, com delicadas maneiras e o seu aspeto venerável, obteve que o sargento da escolta lhe permitisse alugar a mula de um almocreve que seguia a mesma direção. Cavalgou na albarda da mula arreatada com chocalho, sem estribos; empunhou a corda do cabresto, e ladeado de doze praças do 8, entrou ao cair da tarde em Famalicão.
O torres de castelões, o administrador, legitimista no fundo, bom lavrador, mandou-lhe cama para a cadeia e permitiu-lhe que ceasse com uni amigo que o seguira de longe. Era o nunes, o Pílades das horas certas e incertas. Orestes estava desanimado; queixava-se das fantasias do outro, considerava-se perdido.
- Pobre Libânia! - deplorava - quando ela souber que eu estou na relação!
Como tinha alguma prática do foro criminal, o nunes consolava-o: que não havia matéria para pronúncia; e, quando fosse pronunciado, a relação o despronunciaria.
- Eu é que vou ser o teu procurador, se me não prenderem - acrescentava, muito confiado na lei e na sua atividade. - quanto à fantasia do conto de réis, já não falta tudo, porque tens as cem peças das botelhas. Se te deixam ser rei mais um dia ou dois, tinhas nesta santa hora 3750$000 réis.
- Tu gracejas e eu vou esperar na cadeia uma sentença de degredo - atalhou o veríssimo, naquela estranha situação, nunca experimentada, de ouvir os passes da sentinela rentes com a grade do seu quarto.
Às oito da noite, fechara-se a porta da cadeia, e nunes saíra triste, com um pungitivo arrependimento de meter o amigo naquela rascada.