Madame Bovary - Cap. 20: XII Pág. 218 / 382

Charles contemplava-as. Parecia-lhe ouvir a leve respiração da filha. Ela iria agora crescer; cada estação do ano levá-Ia-ia a fazer rapidamente um novo progresso. Já a via regressando da escola ao fim da tarde, toda risonha, com o bibe manchado de tinta, de cestinha no braço; depois seria preciso pô-la num colégio, o que representaria uma despesa grande; como haveria de ser? Então reflectia. Pensava em arrendar uma pequena quinta nos arredores, que ele mesmo vigiaria, todas as manhãs, quando saísse para ir ver os doentes. Pouparia então a receita e pô-la-ia na caixa económica; depois compraria acções em qualquer parte, fosse do que fosse; além disso, a clientela aumentaria; contava que assim sucedesse, porque queria que Berthe tivesse uma boa educação, que fosse prendada, que aprendesse piano. Ahl, como haveria de ser linda, mais tarde, quando tivesse quinze anos, quando, parecendo-se com a mãe, usasse, como ela, grandes chapéus de palha! De longe pareciam duas irmãs. Imaginava-a trabalhando à noite junto deles, à luz do candeeiro; bordaria umas pantufas para ele, tomaria conta do governo doméstico e encheria toda a casa com a sua gentileza e alegria. Finalmente, pensariam em dar-lhe uma situação: encontrariam para ela um bom rapaz com uma posição sólida; ele fá-Ia-ia feliz e assim seria para sempre.

Emma não dormia, fingia que estava adormecida; e, enquanto ao seu lado Charles se deixava vencer pelo sono, ela despertava em sonhos diferentes.

Ao galope de quatro cavalos, era arrebatada, havia oito dias, para um país novo, donde não mais voltariam. Iam, de braços enlaçados, sem falar. Muitas vezes, do alto duma montanha, avistavam subitamente alguma esplêndida cidade com os seus zimbórios, pontes, navios, florestas de limoeiros e catedrais de mármore branco, cujos campanários pontiagudos sustentavam ninhos de cegonhas.





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