A Brazileira de Prazins - Cap. 11: CAPÍTULO X Pág. 98 / 202

Estava casado, e tinha dois filhos. Queria ir tentar a fortuna ao brasil, trabalhar em mangas de camisa, se fosse necessário. O veríssimo respondeu-lhe que o único favor que lhe podia fazer era tirar-lhe um dente de graça. Confidenciou-lhe as suas misérias mais íntimas; que aquela boa rapariga tinha gasto com ele quinze moedas e vendera o seu ouro; mas, tão generosa, tão honrada que nunca lhe vira no rosto uma sombra de tristeza. Que estava resolvido a ir estabelecer-se como dentista na província, logo que pudesse comprar o estojo, que custava 12$000 réis, e não os tinha.

- Se os não tens - disse o Torcato - minha mulher tem um cordão que pesa três moedas; para mim não lho pedia; mas para ti vou buscá-lo amanhã. - e acrescentou, de excelente humor:

- Deus permita que na terra onde te estabeleceres sejam tantas as dores de dentes que não tenhas mãos nem queixos a medir.

Saíram alegres do Tivoli. Sentiam-se bem aquelas duas organizações esquisitas. Havia ali duas almas que se amavam deveras, dois náufragos a quererem chegar um ao outro a mesma tábua de salvação. É nestes esgotos sociais que ainda, uma vez por outra, se encontram Pílades e Orestes.

O veríssimo morava atrás da sé, na rua da lada, uma casa de um andar, muito empenada, com o peitoril de ferro de uma única janela desencravado de uma banda, e uma porta viscosa e negra como a boca de um antro. Cearam todos. Havia cabeça de pescada cozida com cebolas, sardinhas fritas e pimentões. O nunes foi buscar duas garrafas da companhia de tostão à rua chã, e enfiou no braço uma rosca de Valongo, que comprou na bodega da caçoila, uma esmamaçada com cordões de ouro, que frigia peixe à porta e dava arrotos.

Cearam numa estúrdia de rapazes, como em braga, nove anos antes, na tasca do catrâmbias, na rua do alcaide.





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