O Retrato de Ricardina - Cap. 1: CAPÍTULO I - O ABADE DE ESPINHO Pág. 6 / 178

..

- E não diz nada ao pai, não, minha mãezinha? - condicionou Eugénia.

- Mas que segredos podem ser esses que o pai não deve saber?

- Ah! vês? - exclamou Ricardina. - Bem to dizia eu.

- Pois está bom - disse a mãe. - Se o que for puder passar sem o pai saber, não lho digo. Que mais quereis, meninas?!

- Então... digo? - perguntou Eugénia à irmã.

Ricardina abaixou os olhos, aplaudindo com o silêncio a revelação.

Começou Eugénia a contar que a sua mana ficara apaixonada por Bernardo Moniz, desde que o viu. Atalhou logo a mãe:

- Mas ela só o viu duas vezes!... Como se apaixonou depressa!

- Viu-o mais vezes, minha mãe... - contestou a cândida narradora.

- Cá em casa?

- Não, senhora... Via-o acolá em frente nos montados, por onde ele andava a caçar, e via-o na igreja aos domingos. Ele também se apaixonou por ela.

- Como soubeste que ele se apaixonou por ti, Ricardina? - interrompeu a mãe. - Quem to disse? Escreveu-te?

As duas meninas mutuaram um relance de olhos consultivos.

- Assim como assim, o melhor é dizer tudo... - deliberou Eugénia. - Escreveu, sim, senhora.

- Quem trouxe a carta?

- Ninguém.

- Ninguém! Essa é boa!... Então a carta veio sem ninguém a trazer?

- Nós chegámos à janela do mirante ao fundo do passai, quando vimos a carta entre as roseiras que fazem o pavilhão da janela, e vimos Bernardo da parte de além do ribeiro a olhar para nós. Foi ele que lá pôs a carta, quando nos ouviu rir por debaixo da parreira, e supôs que nós íamos para o mirante.

- E depois? - animou a senhora a narrativa, simulando sossego e nenhum espanto do acontecimento. - A carta que dizia?

- Muita coisa. A mãe verá.

- Isso quando foi?

- Há mês e meio, quando ele veio a férias de Páscoa.





Os capítulos deste livro