Madame Bovary - Cap. 24: TERCEIRA PARTE – I Pág. 264 / 382

Subiu ao coro.

A nave mirava-se nas pias cheias de água benta, com o começo das ogivas e algumas porções dos vitrais. Mas o reflexo das cores, quebrando-se na borda do mármore, continuava mais longe, sobre as lajes, como um tapete variegado. A luz exterior penetrava na igreja com três feixes enormes, pelas três portas abertas. De vez em quando, ao fundo, passava um sacristão e fazia diante do altar a oblíqua genuflexão dos devotos apressados. Os lustres de cristal pendiam imóveis. No coro ardia uma lamparina de prata; e das capelas laterais, das partes sombrias da igreja, escapava-se às vezes uma espécie de exalação de suspiros, com o som duma grade que se fechava, repercutindo o seu eco nas altas abóbodas.

Léon, com passos reverentes, caminhava rente às paredes. Nunca a vida lhe parecera tão agradável. Ela chegaria dentro de momentos, encantadora, agitada, espreitando para trás os olhares que a seguiam - e com o seu vestido de folhos, a luneta com cabo de ouro, as botinas finas, com todas as elegâncias que ele nunca saboreara, na inefável sedução da virtude que sucumbe. A igreja, como um gigantesco toucador, dispunha-se em torno dela; as abóbodas inclinavam-se para recolher na sombra a confissão do seu amor; os vitrais resplandeciam para iluminar-lhe o rosto e os turíbulos acendiam-se para que ela aparecesse como um anjo, envolta pelo fumo dos incensos.

Entretanto, ela não vinha. Léon sentou-se numa cadeira e deparou-se-lhe uma vidraça azul onde se viam barqueiros transportando cestos. Fixou-a demoradamente, com atenção, e contou as escamas dos peixes e os botões dos gibões, enquanto o espírito vagueava à procura de Emma.

O suíço, de longe, indignava-se interiormente contra aquele indivíduo que se atrevia a contemplar sozinho a catedral.





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