O Retrato de Ricardina - Cap. 14: CAPÍTULO XIV - PLANOS DO ABADE Pág. 90 / 178

O Bernardo, se estiver aí, há de morrer.

- Pudera! É como Vossa Senhoria diz.

- O juiz de fora de Viseu já hoje queria mandar cercar-lhe a casa, e consultou-me a esse respeito; mas eu, que não tinha o meu plano traçado, convenci o juiz a esperar até depois de amanhã à noite, para eu lhe preparar os meios de não perder a diligência, espionando primeiro se eles aí estão. Logo que cheguei, me contou o Torto que ouvira dizer que esta madrugada, ainda não se via bem, tinham passado pelo menos três pessoas a cavalo e duas ou três a pé, acolá pelo caminho das Rechousas. Não podiam ser senão os três e mais os criados. Bem estamos. Pilhados são eles; mas o meu empenho é que o Bernardo morra. Como há de ser isto? Dá lá a tua ideia, Norberto.

- A minha ideia, Sr. Abade, não lha dou já. Deixe-me Vossa Senhoria pensar duas horas, que ainda há muito tempo. Vou cear alguma coisa e depois hei de dar uma volta cá pra certas congeminências. Quero ver as entradas e saídas da casa da Fonte. Eu logo vejo por onde eles hão de querer fugir; e aí é que é atirar-lhe à cara; mas de modo que a gente não fique culpada na morte; porque a Justiça não há de querer isso.

- Que me importa a mim a Justiça?

- Pois sim; está visto que o fidalgo tanto se lhe dá como se lhe deu; mas diz lá o outro, melhor é que se não saiba. Deixe-me cá o Sr. Abade; que eu gosto de me sair bem das coisas em que me meto, e até agora não me saí mal.

- Pois vai, vai lá fazer as tuas descobertas: mas olha te não vejam.

- A mim? Hão de ter bom olho... Até de manhã ou até logo, Sr. Abade. Vossa Senhoria vai-se deitar?

- Vou que estou moído; mas assim que for dia vem chamar-me.

Norberto ceou e saiu. Foi para casa da mãe e levou-a consigo. A menos de oitavo de légua demorava o majestoso palacete dos Monizes, levantado sobre o terreno da antiga quinta.





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