A Origem das Espécies - Cap. 6: CAPÍTULO V
LEIS DA VARIAÇÃO Pág. 174 / 524

Numa linhagem que não foi cruzada, mas em que ambos os progenitores perderam algum carácter que o seu progenitor tinha, a tendência, forte ou fraca, para reproduzir o carácter perdido pode ser, como se referiu atrás, apesar de tudo o que nos sugere o contrário, transmitida durante quase qualquer número de gerações. Quando um carácter perdido numa linhagem reaparece após um grande número de gerações, a hipótese mais provável não é a de que a prole se assemelha subitamente a um ancestral remoto cerca de uma centena de gerações, mas a de que em cada geração sucessiva há uma tendência para reproduzir o carácter em questão, o qual por fim, em condições favoráveis que desconhecemos, se torna predominante. Por exemplo, é provável que em cada geração de pombos-berberes, que muitíssimo raramente produzem uma ave azul com riscas pretas, haja uma tendência em cada geração para a plumagem adquirir esta cor. É uma perspectiva hipotética, mas pode-se sustentá-la com alguns factos; e não vejo que em abstracto a hereditariedade, num número infinito de gerações, de uma tendência para produzir um carácter qualquer, seja mais improvável do que a hereditariedade de órgãos completamente inúteis ou rudimentares, como todos sabemos que sucede. Na verdade, podemos observar por vezes a transmissão de uma mera tendência para produzir um órgão rudimentar: por exemplo, na erva-bezerra comum (Antirrhinum) o aparecimento de um quinto estame rudimentar é tão frequente que esta planta deve ter herdado a tendência para o produzir.

Como todas as espécies do mesmo género, segundo a minha teoria, supostamente descendem de uma antecessora comum, seria de esperar que variassem por vezes de uma maneira análoga; pelo que alguns dos caracteres da variedade de uma espécie se assemelhariam aos de outra espécie; sendo estoutra espécie, na minha perspectiva, apenas uma variedade bem marcada e permanente.





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