A Origem das Espécies - Cap. 7: CAPÍTULO VI
DIFICULDADES ENFRENTADAS PELA TEORIA Pág. 203 / 524

da descendência, não deve hesitar em ir mais longe e admitir que uma estrutura mesmo tão perfeita como o olho de uma águia se poderia formar por selecção natural, embora neste caso eu não conheça quaisquer graus transicionais. A sua razão devia conquistar a sua imaginação; embora eu tenha sentido a dificuldade demasiado intensamente para ficar surpreendido com qualquer grau de hesitação perante o alargamento do princípio da selecção natural a alturas tão sensacionais.

É quase impossível evitar comparar o olho a um telescópio. Sabemos que este instrumento foi aperfeiçoado pelos esforços prolongados dos maiores intelectos humanos; e inferimos naturalmente que o olho foi formado por um processo análogo. Mas poderá esta inferência ser presunçosa? Teremos direito algum de pressupor que o Criador actua através de poderes intelectuais semelhantes aos do homem? Se temos de comparar o olho a um instrumento óptico, deveríamos imaginar uma camada espessa de tecido transparente, com um nervo sensível à luz por baixo, e então supor que a densidade de cada parte desta camada se modifica contínua e lentamente, de modo a dividir-se em camadas de diferente densidade e espessura, situadas a distâncias diferentes entre si, com as superfícies de cada camada mudando lentamente de forma. Temos também de supor que há um poder que sempre observa atentamente cada ligeira alteração acidental nas camadas transparentes que, sob circunstâncias variadas, possa de alguma maneira, ou em algum grau, tender a produzir uma imagem mais distinta. Temos de supor que cada novo estado do instrumento se multiplica aos milhões; que cada um é preservado até se produzir um melhor, e que então os antigos são destruídos. Em corpos vivos, a variação causará as alterações ligeiras, a geração multiplicá-las-á quase infinitamente e a selecção natural distinguirá com perícia infalível cada aperfeiçoamento.





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