Madame Bovary - Cap. 16: VIII Pág. 170 / 382

Levava nos pés grossos tamancos de madeira e ao longo dos quadris um grande avental azul. O magro rosto, circundado por uma coifa simples, estava mais cheio de rugas do que uma maçã reineta já passada e das mangas da camisola vermelha saíam duas mãos compridas, de articulações nodosas. O pó dos celeiros, a potassa das barrelas e a guarda das lãs a tal ponto as tinham encrostado, escoriado e endurecido, que pareciam sujas, apesar de bem lavadas e passadas por água limpa; e, à força de terem trabalhado, mantinham-se entreabertas, como que para apresentar por si mesmas o humilde testemunho de tantos sofrimentos suportados. Havia uma espécie de rigidez monacal que lhe realçava a expressão do rosto. Nenhuma tristeza ou ternura parecia abrandar aquele olhar baço. No trato com os animais adquirira-lhes o mutismo e a placidez. Era a primeira vez que se via no meio de tanta gente; e, interiormente assustada pelas bandeiras, pelos tambores, pelos senhores de casaca preta e pela cruz de honra do conselheiro, ficou completamente imobilizada, não sabendo se devia avançar ou fugir, nem porque a empurrava a multidão e os examinadores lhe sorriam. Assim se apresentava, diante daqueles prósperos burgueses, esse meio século de servidão.

- Aproxime-se, veneranda Catherine-Nicaise-Élisabeth Leroux!disse o Sr. Conselheiro, que tomara das mãos do presidente a lista dos homenageados.

E, examinando ora a folha de papel, ora a velha mulher, repetia num tom paternal:

- Aproxime-se, aproxime-se!

- Vossemecê é surda? - disse Tuvache, saltando da poltrona.

E pôs-se-lhe a gritar ao ouvido:

- Cinquenta e quatro anos de serviço! Uma medalha de prata! Vinte e cinco francos! É para si.

Depois, quando recebeu a sua medalha, ficou a olhar para ela.





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