Madame Bovary - Cap. 18: X Pág. 193 / 382

É uma carga de trabalhos com esses ladrões! ainda por cima era desonesto.

Soube por um vendedor ambulante que passou por aí este Inverno e foi arrancar um dente que o Bovary continua a trabalhar no duro. Não me admira nada isso, e o homem mostrou-me o dente; tomdmos um café juntos. Perguntei-lhe se ele te tinha visto e disse-me que não, mas que vira dois cavalos na estrebaria, donde concluo que o negócio estd dando. Ainda bem, meus queridos filhos, e que Nosso Senhor vos conceda toda a felicidade que se possa imaginar.

Tenho muita pena de ainda não conhecer a minha querida netinha Berthe Bovary. Plantei para ela, no quintal, por baixo do teu quarto, uma linda ameixieira e não deixo que ninguém lhe toque, a não ser para depois lhe fazer compotas, que vou guardar no armário, para ela comer quando cd vier.

Adeus, meus queridos filhos. Um beijo para ti, minha filha; para si também, meu genro, e para a pequenina, em ambas as faces.

Sou, com muitas saudades,

Vosso pai afectuoso,

Théodore Rouault

Emma ficou ainda alguns minutos com o papel entre os dedos. Os erros de ortografia eram uns atrás dos outros e ela seguia o meigo sentido daquelas palavras que pareciam o cacarejar duma galinha meio escondida atrás duma sebe de espinhos. A tinta fora seca com cinzas de lareira, porque lhe caiu um pouco de pó cinzento sobre o vestido, e parecia-lhe até estar vendo o pai curvado sobre o lume para pegar na tenaz. Há quanto tempo já que não estava ao pé dele, no escabelo, junto à chaminé, quando se punha a queimar a ponta dum pau na grande chama dos juncos marinhos que crepitavam!... Lembrava-se das tardes de Verão cheias de sol. Os poldros relinchavam quando passava alguém e galopavam, galopavam.





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