Madame Bovary - Cap. 19: XI Pág. 201 / 382

Isto não impediu que, cinco dias depois, aparecesse a Tia Lefrançois, desvairada, a gritar:

- Acudam! Ele está a morrer!... Eu perco a cabeça!

Charles precipitou-se para o Leão de Ouro e o farmacêutico, que o viu sar pela praça, sem chapéu, abandonou a farmácia. Apareceu ele também esbaforido, afogueado, inquieto, a perguntar a todos os que subiam a escada:

- O que tem então o nosso interessante estrefópode?

O estrefópode contorcia-se em atrozes convulsões, de tal maneira que encaixa mecânica em que tinha a perna encerrada batia contra a parede, o ponto de a esburacar.

Com muitas precauções, para não deslocar a posição do membro, retirou-se então a caixa e viu-se um espectáculo horroroso. A forma do pé desaparecia numa tal inchação que toda a pele parecia prestes a estalar e estava coberta de equimoses provocadas pelo famoso aparelho. Hippolyte á se queixara com dores, mas não lhe tinham ligado importância; houve ue reconhecer que ele sempre tivera alguma razão e deixaram-no livre durante algumas horas. Mas, mal o edema desaparecera um pouco, logo os ois sábios acharam por bem repor o membro no aparelho, apertando-o mais, para apressar os resultados. Enfim, três dias depois, como Hippolyte á não aguentava mais, retiraram uma vez mais o mecanismo, ao mesmo tempo que ficaram muito admirados com o resultado que se lhes deparo r:

Estendia-se pela perna uma tumefacção lívida, com algumas ampolas por onde escorria um líquido escuro. A coisa tomava um aspecto grave. HiFpolyte começava a aborrecer-se e a Tia Lefrançois instalou-o na sala pequena, ao pé da cozinha, para que ao menos tivesse alguma distracção.

Mas o tesoureiro, que todos os dias ali ia jantar, queixava-se amargamente de tal vizinhança. Levaram então Hippolyte para a sala de bilhar

Ali estava ele, gemendo debaixo de grossos cobertores, pálido, com a barba crescida, os olhos encovados e, de tempos a tempos, voltando a cabeça coberta de suor na suja almofada onde pousavam as moscas.