Madame Bovary - Cap. 21: XIII Pág. 230 / 382

Ora, como da Huchette para Buchy não há outro caminho senão o de Yonville, teve de atravessar a vila, e Emma reconhecera-o, à luz das lanternas que, como um relâmpago, rasgaram o crepúsculo.

O farmacêutico, com o tumulto que se produziu em casa dos Bovary, precipitou-se para lá. A mesa, com todos os pratos, estava tombada: molho, carne, facas, saleiro e galheteiro, tudo espalhado pelo aposento; Charles pedia socorro, Berthe, assombrada, gritava e Félicité, com as mãos a tremer, desapertava a senhora, que tinha movimentos convulsivos por todo o corpo.

- Vou a correr ao laboratório disse o boticário - buscar um pouco de vinagre aromático.

Depois, quando ela voltou a abrir os olhos com o cheiro do frasco, disse ainda:

- Eu tinha a certeza; isto até acordava um morto.

- Fala! - dizia Charles -, fala connosco! Sossega! Sou eu, o teu Charles, que te ama! Não me reconheces? Olha, aqui tens a tua filhinha: vá, dá-lhe um beijo!

A criança estendia os braços à mãe para se lhe pendurar no pescoço.

Mas, desviando a cabeça, Emma disse com voz sacudida:

- Não, não... ninguém!

E tornou a desmaiar. Levaram-na para a cama.

Ficou ali estendida, de boca aberta, com as pálpebras cerradas, as mãos estendidas, imóvel e branca como uma estátua de cera. Dos olhos saíam-lhe dois fios de lágrimas que corriam lentamente sobre o travesseiro.

Charles, de pé, conservava-se ao fundo da alcova e o farmacêutico, junto dele, mantinha o silêncio meditativo que convém adoptar nas ocasiões sérias da vida.

- Tenha calma - disse ele, dando-lhe um toque no cotovelo. - Parece-me que o paroxismo já passou.

- Sim, agora está a repousar um pouco! - respondeu Charles, que a via dormir. - Minha pobre mulher!... Minha pobre mulher!.





Os capítulos deste livro