Madame Bovary - Cap. 29: VI Pág. 312 / 382

Levava-lhe de Yonville rosas dentro do seio, que lhe atirava ao rosto, mostrava-se preocupada com a saúde dele, dava-lhe conselhos sobre a maneira de se conduzir; e, para melhor o reter, esperando que o Céu talvez desse uma ajuda, pendurou-lhe ao pescoço uma medalha da Virgem. Como uma mãe cuidadosa, pedia-lhe informações sobre os camaradas. Dizia-lhe:

- Não andes com eles, não saias, pensa só em nós; ama-me!

Ela desejaria poder vigiar-lhe os passos e teve a ideia de mandar alguém segui-lo pelas ruas. Havia sempre, ao pé do hotel, uma espécie de vagabundo que se abeirava dos passageiros e que não recusaria... mas o seu orgulho revoltou-se.

- Oh! Deixá-lo! Que me importa a mim que ele me engane! Que interesse tenho eu?

Um dia em que se tinha despedido muito cedo e em que ela caminhava sozinha pela avenida, avistou os muros do seu convento; sentou-se então num banco, à sombra dos álamos. Que tempo calmo havia sido aquele!

Como invejara então os inefáveis sentimentos de amor que, segundo os livros, procurava imaginar!

Os primeiros meses do casamento, os seus passeios a cavalo pelo bosque, o Visconde a dançar a valsa e Lagardy a cantar, tudo voltou a passar-lhe diante dos olhos... E Léon pareceu-lhe subitamente tão distanciado como os outros.

«No entanto, eu amo-o!», pensava ela.

Paciência! Não era feliz, nem nunca o fora, donde provinha então aquela deficiência da vida, aquela instantânea decomposição de todas as coisas a que se agarrasse? .. Mas se existisse em qualquer parte um ser forte e belo, uma natureza valorosa, simultaneamente cheia de exaltação e de requintes, um coração de poeta com a forma de um anjo, lira de cordas metálicas, entoando para o céu epitalâmios elegíacos, porque não haveria ela de, por acaso, encontrá-lo? Oh!, que impossibilidade! Aliás, nada valia a pena ser procurado; tudo era ilusório! Cada sorriso escondia um bocejo de enfado, cada alegria uma maldição, cada prazer o seu fastio, e os melhores beijos apenas deixam nos lábios um irrealizável desejo de mais exaltada volúpia.





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