Madame Bovary - Cap. 30: VII Pág. 328 / 382

O tempo estava lindo; era um daqueles dias do mês de Março, claros e secos, em que o Sol brilha num céu todo branco. Os Ruanenses endorningados passeavam com ares de pessoas felizes. Emma chegou à Place du Parvis. Os fiéis saíam das vésperas; a multidão escoava-se pelas três portas da igreja, como um rio por três arcos duma ponte, e, ao centro, mais imóvel do que um rochedo, estava o suíço.

Então ela lembrou-se do dia em que, toda ansiosa e cheia de esperanças, penetrara naquela grande nave, que se estendera na sua frente menos profunda do que o amor que tinha no peito; e continuou a andar, chorando por debaixo do véu, aturdida, cambaleante, quase a desfalecer.

- Cuidado! - gritou uma voz saindo dum portão que se abria. Ela parou para deixar passar um cavalo preto, garbosamente atrelado aos varais dum tílburi conduzido por um cavalheiro de casaco de pele de zibelina. Quem era ele? Emma conhecia-o... O carro partiu e desapareceu.

Mas era o Visconde! Ela voltou-se: a rua estava deserta. E sentia-se tão acabrunhada, tão triste, que se encostou à parede para não cair.

Depois pensou que se tivesse enganado. Afinal não sabia nada acerca dele. Tudo, quer dentro quer fora dela, a abandonava. Sentia-se perdida, rolando ao acaso por indefiníveis abismos; e foi quase com alegria que avistou, ao chegar à Cruz Vermelha, o bom Homais, que fiscalizava enquanto carregavam na Andorinha uma grande caixa cheia de provisões farmacêuticas. Tinha na mão um lenço com meia dúzia de cheminots para a mulher.

A Sr! Homais apreciava muito aqueles pãezinhos massudos, com o feitio de turbantes, que se comem na Quaresma com manteiga salgada: último vestígio de alimentos góticos, que remonta talvez ao século das cruzadas e de que os robustos Normandos outrora se enchiam, imaginando ver sobre a mesa, à luz das tochas, entre as canecas de hipocraz e as gigantescas vitualhas, cabeças de sarracenos para devorar.





Os capítulos deste livro