Madame Bovary - Cap. 30: VII Pág. 331 / 382

Então olharam-se as duas em silêncio. Não tinham, a criada e a patroa, nenhum segredo uma para a outra. Por fim, Félicité suspirou:

- Eu, no lugar da senhora, ia falar com o Sr. Guillaumin.

- Achas?..

E esta interrogação queria dizer:

«Tu, que conheces a casa por intermédio do criado, achas que o patrão falou alguma vez de mim?»

- Sim, vá! Acho que faz bem.

Emma vestiu-se, enfiou o vestido preto, pôs o chapéu com pedrinhas de azeviche; e, para que não a vissem (havia ainda muita gente na praça), deu a volta por fora da aldeia, pelo caminho à beira do riacho.

Chegou ofegante à frente do portão do notário; o céu estava escuro e caía um pouco de neve.

Ao som da campainha, Théodore, de colete vermelho, apareceu no vestíbulo; veio abrir-lhe quase familiarmente, como a uma pessoa conhecida, e mandou-a entrar para a sala de jantar.

Um grande fogão de porcelana ronronava por baixo dum cacto que ocupava o nicho, e, em molduras de madeira negra, nas paredes forradas com um papel a imitar carvalho, estavam os quadros: Esmeralda, de Steuben, e Putifar, de Schopin. A mesa posta, dois aquecedores de prata, os puxadores das portas de cristal, o sobrado e os móveis, tudo reluzia com um asseio meticuloso, à inglesa; as janelas eram enfeitadas, aos cantos, com vidros de cor.

«Aqui está uma sala de jantar», pensava Emma, «como eu gostaria de ter».

O tabelião entrou, segurando contra o corpo, com o braço esquerdo, o seu roupão de alamares, enquanto com a outra mão tirava e voltava o pôr rapidamente o seu boné de veludo castanho, pretensiosamente inclinado para o lado direito, para onde caíam as pontas de três madeixas louras que, partindo da nuca, lhe contornavam a calva.

Depois de ter oferecido uma cadeira, sentou-se para almoçar, pedindo muitas desculpas pela falta de cortesia.





Os capítulos deste livro