Madame Bovary - Cap. 10: SEGUNDA PARTE – I Pág. 85 / 382

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- Não são velhacos como ele que me metem medo! - interrompeu a hospedeira, sacudindo os fortes ombros. - Deixe lá, Sr. Homais, enquanto existir, o Leão de Ouro há-de ter sempre freguesia! É que nós temos meios, Sr. Homais! Ao passo que um destes dias verá o Café Francês fechado com um belo anúncio nas portas!... Trocar o meu bilhar - continuava, falando para si mesma -, tão cómodo para lhe estender a roupa em cima e que me já tem servido, na época da caça, para lá deitar até seis pessoas!... Ora aquela lesma do Hivert que não há meio de chegar!

- Está à espera dele para servir o jantar aos seus hóspedes? perguntou o farmacêutico.

- Esperar? E então o Sr. Binet! Vai vê-lo entrar às seis horas em ponto, que não há no mundo quem se lhe compare em pontualidade. Não dispensa o seu lugarzinho na sala pequena! Seria mais fácil matá-lo do que obrigá-lo a comer noutro sítio! E como é fastiento! E exigente com a sidra! Não é como o Sr. Léon; esse chega às vezes às sete horas, sete e meia até; nem sequer olha para o que come. Que bom moço! Nunca diz uma palavra mais alta do que outra.

- Sabe, é qlle há muita diferença entre uma pessoa que recebeu uma boa educação e um antigo soldado que agora é tesoureiro municipal.

Bateram as seis horas. Biner entrou.

Trazia uma casaca azul, que lhe caía a direito em volta do corpo magro, e o seu boné de cabedal, de orelhas atadas por cordões no alto da cabeça, deixava ver, por baixo da pala levantada, uma testa calva, marcada pelo uso do capacete. Usava um colete de pano preto, colarinho de crina, calças cinzentas e, durante todo o ano, umas botas muito bem engraxadas, com duas dilatações paralelas devidas às saliências dos tornozelos. Nem um pêlo lhe ultrapassava a linha da barba loura que, cortada à passa-piolho, lhe contornava o queixo, como a cercadura de um canteiro, emoldurando-lhe o rosto comprido e macilento, de olhos pequenos e nariz achatado.





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