A Ilha Misteriosa - Cap. 17: CAPÍTULO VI Pág. 100 / 186

O prisioneiro, se assim se lhe podia chamar, estava calmo e parecia ser surdo-mudo. Para espanto dos colonos, chegada a hora do jantar, recusou-se a tocar na carne cozinhada que Pencroff lhe estendeu, mas não se fez rogado com um pato-bravo que Harbert acabara de matar... Com enorme bestialidade, devorou a carne crua num abrir e fechar de olhos!

- Santo nome de Deus! - exclamou o marinheiro, sinceramente penalizado. - Ao que este desgraçado chegou!

Na manhã seguinte, dia 15 de Outubro, o Boaventura levantou ferro e rumou a nordeste. O primeiro dia da travessia decorreu normalmente, com ventos de feição. O mar alto e a ondulação pareciam ter um efeito benéfico no prisioneiro, que se mantinha tranquilo na cabina da frente. Como antigo marinheiro, quem sabe se o facto de se encontrar a bordo não despertaria nele qualquer memória do passado? No dia 16, porém, o vento rodou para norte e começou a bater de proa, dificultando extraordinariamente o avanço do Boaventura. Com efeito, no dia seguinte de manhã, quando previam atingir as proximidades da ilha Lincoln, não havia sinal de terra no horizonte. Outro dia passou e a situação mantinha-se: nortada forte, mar encapelado e da ilha nem sinal! O marinheiro começou a ficar preocupado. Onde estaria a ilha, que diabo? Para piorar as coisas, as vagas abanavam a chalupa por todos os lados. A dada altura, uma onda maior passou por cima da amurada e varreu o convés. Nisto, o prisioneiro saltou para fora da cabina e com uma alavanca abriu uma fenda na amurada para que a água se escoasse; feito isto, enfiou-se outra vez no seu canto sem uma palavra. Os outros, estupefactos, deixaram- -no agir. Fora, certamente, o velho instinto de homem do mar a dar sinal de si.

Na noite de 19 para 20, as condições atmosféricas acalmaram um pouco.





Os capítulos deste livro