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Capítulo 18: Capítulo 18

Página 161

Ao clarão da tocha que espargia uma luz mortiça, o guerreiro contemplou-a naquele inquieto dormir. Era bela; mais bela que nos tempos da primeira mocidade! O seu gesto angélico, desbotado pela palidez, emagrecido pelos pesares e terrores, ganhara em expressão, em reflexo dos íntimos pensamentos o que perdera em viço e em toques de inocência. Bonina desabrochada nos campos da vida, brilhara com todas as pompas do seu vicejar à luz da manhã; o ardor intenso do meio-dia a fizera pender; a viração da tarde lhe traria, talvez, ainda frescor e viveza; mas a sua fragrância perdia-se nas auras que passavam; nas suas cores harmoniosas revia-se, apenas, o céu! Aquela alma fugia solitária pela terra num viver incompleto e volveria aos abismos da criação sem conhecer o mais profundo e enérgico dos afectos humanos, o amor, que une dois espíritos como dois fragmentos de um todo, os quais a Providência separou ao lançá-los na terra, e que devem buscar-se, unir-se, completar-se, até irem, depois da morte, formar, talvez, uma só existência de anjo no seio de Deus.

Mas quando Eurico se lembrou de que, porventura, isto era sonho; de que podia ser que essa alma não passasse na vida tão vazia e solitária como ele julgava, e que esse coração, que poucas horas antes pulsara tão perto do seu, batia, acaso, por outrem, sentiu o suor frio manar-lhe da fronte. A tocha baça e fúnebre que mal alumiava a irmã de Pelágio pareceu-lhe retinta em sangue: e, como o cedro arrancado por tufão repentino, foi encostar-se à rocha lateral, cuja superfície irregular lhe escondia Hermengarda. O vê-la despertara todo o delírio do seu primeiro amor, e aquela ideia intolerável, que tantas vezes o atormentara nas solidões do Calpe, espremia-lhe agora o coração com redobrado furor.

E assim ficou por alguns momentos mudo, anelante, aniquilado. Quem era, onde estava, porque viera ali, não o saberia dizer. Os pensamentos revolviam-se-lhe na mente, como as ondas num sorvedouro marítimo, tempestuosos, rápidos e indistintos.

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pág. 161 (Capítulo 18)

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Capa do livro Eurico, o Presbítero
Páginas: 186
Página atual: 161

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
Capítulo 1 1
Capítulo 2 4
Capítulo 3 7
Capítulo 4 12
Capítulo 5 18
Capítulo 6 22
Capítulo 7 28
Capítulo 8 32
Capítulo 9 46
Capítulo 10 55
Capítulo 11 63
Capítulo 12 71
Capítulo 13 90
Capítulo 14 105
Capítulo 15 121
Capítulo 16 134
Capítulo 17 148
Capítulo 18 158
Capítulo 19 171
Capítulo 20 176