Mas vão mais fundo os problemas de perpetuar a sociedade hierárquica. Só há quatro modos de um grupo governante abandonar o poder. Ou é vencido de fora, ou governa tão ineficientemente que as massas são levadas à revolta, ou permite o aparecimento de um grupo médio forte e descontente, ou perde a confiança em si e a disposição de governar. Essas causas não funcionam de per si, e via de regra as quatro se apresentam em diferentes proporções.
Uma classe dominante que possa se guardar contra as quatro permaneceria eternamente no poder. No fim de contas, o fator determinante é a atitude mental da própria classe dominante. Depois de meados deste século, desapareceu o primeiro perigo. As três potências em que o mundo se dividiu são de fato invencíveis, e só poderiam se tornar vulneráveis por meio de lentas mutações demográficas que um governo com amplos poderes consegue evitar facilmente. O segundo perigo, também é apenas teórico. As massas nunca se revoltarão espontaneamente, e nunca se revoltarão apenas por ser oprimidas. Com efeito, se não se lhes permite ter padrões de comparação -nem ao menos se darão conta de que são oprimidas. As crises económicas decorrentes do passado eram totalmente desnecessárias e hoje já não podem se verificar, mas podem suceder outros deslocamentos igualmente grandes, sem que haja resultados políticos, por não existir maneira de articular o descontentamento e dar-lhe vasão. No que tange ao problema da superprodução, latente em nossa sociedade desde o desenvolvimento da técnica da máquina, é resolvido por meio do método da guerra contínua (vide Capítulo 3), também útil para manter o moral público no diapasão desejado. Do ponto de vista dos nossos atuais governantes, portanto, os únicos perigos genuínos são a formação de um novo grupo de gente capaz, sem muito trabalho, e faminta de poder, e o crescimento do liberalismo e do ceticismo nas suas fileiras governamentais.