Capítulo 19: Capítulo XIX
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Agora, os inquisidores 'não eram os monstros de uniforme negro, mas intelectuais do Partido, homenzinhos rotundos de movimentos rápidos e óculos brilhantes, que se ocupavam dele em rodizio durante períodos que duravam - ele calculou, sem certeza - dez e doze horas, sem interrupção. Esses interrogadores providenciavam para ele que sentisse uma dor constante, embora ligeira; mas não era a dor a sua maior arma. Davam-lhe tapas na cara, torciam-lhe as orelhas, puxavam-lhe o cabelo, obrigavam-no a ficar de pé numa só perna, recusavam-se a dar licença para urinar, focavam lâmpadas fortes nos seus olhos, até lacrimejarem; porém o propósito disto tudo era apenas humilhá-lo e destruir-lhe o poder de raciocínio e argumentação. Sua verdadeira arma era o interrogatório impiedoso que continuava, hora após hora, arquitetando armadilhas, fazendo-o tropeçar aqui e ali, torcendo tudo quanto dissesse, condenando-o a cada passo pelas suas mentiras e contradições, até ele começar a chorar, tanto de vergonha como de fadiga nervosa. Frequentemente, faziam-no chorar até meia-dúzia de vezes numa única sessão. A maior parte do tempo insultavam-no aos brados e, a cada hesitação, o ameaçavam de devolução aos guardas; havia também momentos em que de repente mudavam de tom, chamavam-no camarada, apelavam para ele em nome do Ingsoc e do Grande Irmão, e lhe perguntavam pateticamente se não tinha suficiente lealdade ao Partido para desejar desfazer o mal que fizera. Quando tinha os nervos em frangalhos, depois de horas e horas de interrogatório, até esse apelo podia reduzi-lo a um choro fungado. Por fim, as vozes insistentes o venciam mais completamente do que as botas e os punhos dos guardas. Tornou-se apenas uma boca que dizia, uma mão que assinava, tudo quanto lhe fosse exigido.
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