- Vamos para aquela mesa debaixo da teletela, - disse Syme. - E no caminho pegamos um gin.
O gin foi servido em xícaras de louça sem asa. Atravessaram em ziguezague o salão cheio e largaram as bandejas numa mesa de tampo de metal, no canto da qual alguém
deixara um lago de cozido, um líquido nojento que parecia vômito. Winston apanhou -a xícara de gin, fez uma pausa para ganhar coragem e engoliu a beberagem de gosto oleoso. Ao limpar as lágrimas dos olhos, descobriu de repente que estava com fome. Pôs-se a engolir colheradas do cozido que, entre outros ingredientes, tinha cubos de uma massa rosada, esponjosa, que devia ser uma carne qualquer. Nenhum dos dois falou enquanto não esvaziaram as marmitas. Na mesa à esquerda de Winston, um pouco para trás, alguém falava rápido, sem parar, uma cantilena áspera que parecia o grasnar de um pato, e que conseguia romper o falatório da cantina.
- Como vai o dicionário? - perguntou Winston, levantando a voz para se fazer ouvir.
- Devagar - respondeu Syme. - Estou nos adjetivos. É fascinante. O rosto se lhe iluminara imediatamente com a menção da Novilíngua. Empurrou a marmita para o lado, apanhou com a mão delicada o cubo de queijo, o pedaço de pão com a outra, e inclinou-se sobre a mesa, para poder falar sem gritar.
- A Décima Primeira Edição será definitiva - disse ele. - Estamos dando à língua a sua forma final - a forma que terá quando ninguém mais falar outra coisa. Quando tivermos terminado, gente como tu terá que aprendê-la de novo. Tenho a impressão de que imaginas que o nosso trabalho consiste principalmente em inventar novas palavras. Nada disso! Estamos é destruindo palavras - às dezenas, às centenas, todos os dias.