As patrulhas poderiam detê-lo se o vissem. "Posso examinar teus papéis, camarada? Que estás fazendo aqui? A que hora saíste do trabalho? É o teu caminho habitual para casa?" e assim por diante. Não que houvesse algum regulamento contra o regresso ao lar por um caminho diferente, mas bastava para chamar a atenção da Polícia do Pensamento. De repente, a rua toda se agitou. De todos os lados soaram gritos de advertência. Os populares se escondiam em casa como coelhos. Uma moça saltou de uma porta, pouco adiante de Winston, agarrou uma criancinha que brincava numa poça, embrulhou-a no avental e tornou à casa, num pulo. No mesmo instante um homem de terno preto, amassado como uma sanfona, e que surgira de um beco lateral, correu para Winston, apontando o céu, muito nervoso:
-Vapor! - gritou. - Cuidado, patrão! Estoura já! Deita logo! Não se sabia porque os proles tinham dado o apelido de vapor" às bombas-foguete. Winston prontamente se jogou de bruços. Os proles raro se enganavam quando faziam essa advertência. Pareciam possuir uma espécie de instinto que lhes dizia, com vários segundos de antecedência, que um foguete estava chegando, embora voassem mais rápido que o som. Winston protegeu a cabeça com os antebraços. Houve um ribombo que pareceu fazer o chão ofegar. Uma chuva de detritos caiu-lhe nas costas. Quando se levantou viu que estava coberto de fragmentos de vidro da janela próxima.
Continuou andando. A bomba demolira um grupo de casas duzentos metros além, na mesma rua. Elevava-se para o céu uma nuvem negra de fumaça, e debaixo dela outra de pó de caliça, na qual já se formava a multidão, cercando os escombros. Diante dele, no lajedo, havia um montículo de reboco e estuque, e no meio uma faixa vermelho vivo.