CAPÍTULO 2 Cerca de um quarto de légua distante da igreja, e por detrás de um pequeno monte coberto de castanheiros velhos, estendia-se a rica herdade chamada do Capitão, nome que lhe viera dos avoengos do atual possuidor, o Sr. José da Costa, o mais abastado lavrador daquelas redondezas, homem honrado em toda a aceção da palavra, um pouco rude, sim, mas que nem por isso deixava de exercer, havia oito anos, com toda a consciência e retidão, o importante cargo de juiz eleito da freguesia, sendo, além disso, juiz, mesário ou irmão de quantas confrarias e irmandades ali existiam.
Tinha ele um filho, único herdeiro dos seus haveres, chamado Fernando, a quem, por mera deliberação sua, mandara aos catorze anos para o Porto estudar preparatórios para se formar em medicina.
Fernando, que não passara até então de um pobre rapaz, sem ilustração nem pretensões, acostumou-se depois por tal forma aos hábitos da cidade e àquela vida livre e risonha de estudante, que dentro em pouco tempo tornara-se o mais alegre, espirituoso e casquilho de todos os seus condiscípulos, pois que para tudo lhe dava de sobra a recheada bolsa do seu pai, sempre aberta às suas mais pequenas necessidades e exigências.
Apesar disso, Fernando não desaproveitava o tempo, e, como era dotado de uma bela inteligência e aplicado ao estudo, tornara-se ao mesmo tempo um aluno distinto nas aulas que frequentava, recebendo por vezes, com grande contentamento dos seus pais, algumas distinções e prémios pelo seu bom aproveitamento.
Aos vinte e três anos achava-se já matriculado no quarto ano da Escola Médica, tendo até ai dado provas bem patentes da sua feliz vocação para a carreira a que se destinava.
É nesta época que precisamos travar com ele conhecimento.