Madame Bovary - Cap. 31: VIII Pág. 341 / 382

Emma curvara a fronte, e ele acabou por beijá-la sobre as pálpebras, carinhosamente, com a ponta dos lábios.

- Mas tu choraste! - disse ele. - Porquê?

Ela rompeu em soluços. Rodolphe pensou que fosse a explosão do seu amor; uma vez que se calara, interpretou o silêncio como a última resistência do pudor e então exclamou:

- Ah! Perdoa-me! Tu és a única de quem eu gosto. Fui imbecil e mau.

Mas amo-te e hei-de amar-te sempre!. .. O que tens? Diz-me lá!

E ajoelhava-se diante dela.

- Pois bem!... Estou arruinada. Rodolphe! Vais-me emprestar três mil francos!

- Mas..., mas... - dizia ele, erguendo-a a pouco e pouco, enquanto o semblante lhe assumia uma expressão grave.

- Sabes - continuava ela precipitadamente - que o meu marido tinha depositado toda a sua fortuna à guarda dum notário; ele fugiu. Pedimos dinheiro emprestado; os clientes não pagavam. Aliás, ainda não liquidaram tudo; vamos receber mais tarde. Mas hoje, por falta de três mil francos, fazem-nos uma penhora; agora, neste mesmo instante; e, como contava com a tua amizade, vim procurar-te.

«Ah!», pensou Rodolphe, empalidecendo repentinamente, «foi por isto que ela cá veio!»

Por fim, disse calmamente:

- Não os tenho, minha querida senhora.

Não mentia. Se os tivesse, dar-lhos-ia certamente, ainda que, em geral, seja tão desagradável cometer tão belas acções: porque um pedido pecuniário é a mais fria e devastadora de todas as tempestades que podem desabar sobre o amor.

Ela ficou primeiramente alguns minutos a observá-lo.

- Não os tens!

Repetiu várias vezes:

- Não os tens!... Eu devia ter-me poupado a esta última vergonha.

Nunca me amaste! Não vales mais do que os outros!

Traía-se, era a sua perdição.

Rodolphe interrompeu-a, afirmando que ele próprio se encontrava «em embaraços».





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