O Ingénuo - Cap. 16: Capítulo 16 Pág. 67 / 91

O padre Tout-à-tous tratou de acalmá-la com estas doces palavras:

- Primeiramente, minha filha, nunca diga meu noivo; tem qualquer coisa de mundano, que poderia ofender a Deus. Diga meu esposo, pois, embora ainda o não seja, considera-o como tal, e nada é mais decente.

»Por outro lado, embora seja ele seu esposo em pensamento, em esperança, não o é de fato: e assim não cometeria adultério, pecado enorme que cumpre sempre evitar na medida do possível.

»Em terceiro lugar, as ações não têm malícia de culpa quando a intenção é pura.

»Por último, existem na santa antiguidade alguns exemplos que servem à maravilha para nortear seu procedimento. Refere Santo Agostinho que, sob o proconsulado de Septimius Acindynus, no ano 340 da nossa salvação, um pobre homem, não podendo pagar a César o que pertencia a César, foi condenado à morte, como é justo, apesar da máxima: Onde não há nada, o rei perde os seus direitos. Tratava-se de uma libra de ouro. Tinha o réu uma esposa a quem Deus aquinhoara com a beleza e a prudência. Um velho ricaço prometeu dar-lhe uma libra de ouro, e até mais, sob a condição de praticar com ela o pecado imundo. A dama não julgou que fizesse mal nenhum em salvar a vida. ao marido. Santo Agostinho encarece grandemente a sua generosa resignação. É verdade que o velho ricaço a enganou e talvez o marido não tenha deixado de ir para a forca; mas a esposa fizera tudo o que estava a seu alcance para salvar-lhe a vida.





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