A Origem das Espécies - Cap. 7: CAPÍTULO VI
DIFICULDADES ENFRENTADAS PELA TEORIA Pág. 206 / 524

Podemos assim, como infiro a partir da interessante descrição que o Professor Owen faz destas partes, compreender o estranho facto de todas as partículas de alimentos e líquidos que engolimos terem de passar sobre o orifício da traqueia, com algum risco de cair nos pulmões, apesar do belo apetrecho que faz fechar a glote. Nos vertebrados superiores, as brânquias desapareceram completamente - as ranhuras nos lados do pescoço e o percurso convoluto das artérias assinalando ainda no embrião a sua posição anterior. Mas é concebível que as brânquias, hoje completamente perdidas, possam ter sido gradualmente integradas pela selecção natural para um propósito completamente distinto: da mesma maneira que, segundo a perspectiva mantida por alguns naturalistas de que as brânquias e as escamas dorsais dos Anelídeos são homólogas às asas e aos élitros dos insectos, é provável que órgãos que num período muito antigo serviam para a respiração se tenham efectivamente convertido em órgãos de voo.

Ao considerar transições de órgãos, é tão importante ter em mente a probabilidade de conversão de uma função para outra, que apresentarei mais um exemplo. Os cirrípedes pedunculados têm duas dobras minúsculas de pele, a que chamo os «freios ovígeros», que servem, através de uma secreção pegajosa, para reter os ovos até à sua eclosão dentro da bolsa. Estes cirrípedes não têm brânquias, servindo toda a superfície do corpo e a bolsa, incluindo os pequenos freios, para a respiração. Os Balnidae ou cirrípedes sésseis, por outro lado, não têm freios ovígeros, repousando os ovos livremente no fundo da bolsa, na concha bem fechada; mas têm brânquias com grandes dobras. Penso que ninguém porá em causa que os freios ovígeros numa família são estritamente homólogos às brânquias da outra família; na verdade, transitam gradativamente de uma para outra.





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