A Origem das Espécies - Cap. 7: CAPÍTULO VI
DIFICULDADES ENFRENTADAS PELA TEORIA Pág. 208 / 524

Geralmente, quando o mesmo órgão aparece em diversos membros da mesma classe, especialmente em membros que têm hábitos de vida muito diferentes, podemos atribuir a sua presença à hereditariedade a partir de um ancestral comum; e a sua ausência em alguns membros à sua perda pelo desuso ou por meio da selecção natural. Mas se os órgãos eléctricos tivessem sido herdados de um progenitor antigo assim provido, poderíamos esperar que todos os peixes eléctricos estivessem especialmente relacionados uns com os outros. Tão-pouco a geologia leva de todo em todo à crença de que outrora a maior parte dos peixes tinham órgãos eléctricos, que a maior parte dos seus descendentes modificados perderam. A presença de órgãos luminosos em alguns insectos, pertencentes a famílias e ordens diferentes, apresenta um caso análogo de dificuldade. Poder-se-ia apresentar outros casos; por exemplo, nas plantas, o apetrecho muito curioso de uma massa de grãos de pólen, suportados por um pedúnculo com uma glândula pegajosa na ponta, é a mesma nas Orchis e Asclepias, - géneros quase tão remotos quanto possível entre plantas florígeras. Em todos estes casos de duas espécies muito distintas munidas aparentemente com o mesmo órgão anómalo, deve-se observar que, embora a aparência geral e a função do órgão possam ser as mesmas, pode-se geralmente detectar alguma diferença fundamental. Tendo a crer que quase da mesma maneira como por vezes dois homens descobriram independentemente a mesmíssima invenção, assim a selecção natural, funcionando para o bem de cada ser e tirando partido de variações análogas, modificou por vezes quase da mesma maneira duas partes em dois seres orgânicos, que não devem senão pouco da sua estrutura comum à herança do mesmo ancestral.




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