Madame Bovary - Cap. 7: VII Pág. 49 / 382

Emma recebia aquelas lições; a Sr. Bovary era pródiga em lhas dar; e as expressões minha filha e minha mãe repetiam-se durante todo o dia, acompanhadas de uma breve tremura dos lábios, cada qual pronunciando palavras meigas com uma voz trémula de cólera.

No tempo da Sr.ª Dubuc, a velho ta sentia-se ainda preferida; mas, actualmente, o amor de Charles por Emma parecia-lhe desprezo pela sua ternura, uma invasão daquilo que lhe pertencia; e observava a felicidade do filho com um silêncio triste, como alguém que, depois de arruinado, espreitasse, através da janela, outras pessoas instaladas à mesa da sua antiga casa. Recordava-lhe, à maneira de lembrança, os seus esforços e sacrifícios e, comparando-os com as negligências de Emma, concluía não ser de forma alguma razoável adorá-la de um modo tão exclusivo.

Charles não sabia como responder; respeitava a mãe e amava infinitamente a sua mulher; considerava infalível o raciocínio de uma e, no entanto, achava a outra irrepreensível. Quando a Sr." Bovary se tinha ido embora, ele arriscava timidamente e com os mesmos termos uma ou duas das observações mais inofensivas que ouvira fazer à mãe; Emma, provando-lhe com uma só palavra que ele se enganava, mandava-o ir ter com os seus doentes.

No entanto, segundo teorias que julgava boas, ela quis entregar-se ao amor. Ao luar, no jardim, recitava tudo o que sabia de cor de versos apaixonados e cantava-lhe, entre suspiros, melancólicos adágios; mas achava-se a seguir tão calma como antes e Charles não se mostrava nem mais amoroso nem mais agitado.

Depois de ter assim tentado chegar-lhe ao coração sem conseguir arrancar-lhe uma única centelha, incapaz, além disso, de compreender aquilo que não sentia, como também de acreditar em tudo o que não se manifestasse sob as formas convencionais, não teve dificuldade em se convencer de que a paixão de Charles nada mais tinha de extraordinário.





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