Tudo isso resultava em muita consideração para Bovary.
Charles chegava a sentir-se mais importante pelo facto de possuir uma mulher como aquela. Mostrava com orgulho dois pequenos esboços que tinha na sala, feitos por ela a carvão e mandados encaixilhar por ele em enormes molduras, suspensas contra o papel da parede por compridos cordões verdes. À hora de sair da missa, as pessoas viam-no à porta de casa calçando belas pantufas bordadas.
Recolhia-se tarde, às dez horas, por vezes à meia-noite. Então pedia comida e, como a criada já estava deitada, era Emma que o servia. Despia a sobrecasaca para jantar mais à vontade. Mencionava uma atrás da outra rodas as pessoas que encontrara, as aldeias onde estivera, as receitas que passara e, satisfeito consigo mesmo, comia o resto da carne, descascava o queijo, trincava uma maçã, esvaziava a garrafa e depois ia enfiar-se na cama, deitava-se de costas e ressonava.
Como usara durante muito tempo a carapuça de dormir, o lenço não lhe ficava seguro nas orelhas; de modo que, de manhã, tinha os cabelos emaranhados e caídos sobre o rosto, todos esbranquiçados com a penugem da almofada, cujos cordões se desatavam durante a noite. Trazia sempre umas botas grossas, com duas rugas oblíquas desde o peito do pé até ao tornozelo, enquanto o resto das gáspeas era liso e esticado como se contivessem um par de pés de madeira. Dizia ele que serviam muito bem assim para o campo. A mãe aprovava-lhe aquela economia, pois vinha visitá-lo como dantes sempre que em casa dela tivesse havido qualquer borrasca um tanto violenta; e, no entanto, a Sr. Bovary mãe parecia mostrar má vontade contra a nora. Achava-a gastadora de mais para as suas posses; a lenha, o açúcar e a luz escoavam-se como numa casa opulenta e a quantidade de carvão que se queimava na cozinha daria para vinte e cinco pratos! Arrumava-lhe a roupa nos armários e ensinava-a a prestar atenção à quantidade de carne que lhe traziam do talho.