Madame Bovary - Cap. 9: IX Pág. 69 / 382

O rapaz da posta, que, todas as manhãs, vinha limpar a égua, atravessava o corredor com os seus grossos tamancos; tinha a blusa cheia de buracos e os pés sem meias. Era aquele o lacaio de calção curto com que tinha de se contentar! Terminada a sua tarefa, não voltava mais durante o dia; era Charles que, quando regressava, levava pessoalmente o cavalo para a cavalariça, lhe retirava a sela e punha o cabresto, enquanto a criada trazia um molho de palha e o atirava, como podia, para dentro da manjedoura.

Para substituir Nastasie (que acabou por sair de Tostes vertendo rios de lágrimas), Emma admitiu ao seu serviço uma rapariguinha de catorze anos, órfã e de aspecto meigo. Proibiu-a de usar toucas de algodão, ensinou-lhe a falar utilizando a terceira pessoa, a servir um copo de água em cima de um prato, a bater às portas antes de entrar e a passar a ferro, a engomar e a vestir a senhora; quis fazer dela a sua criada de quarto. A nova criadita obedecia sem murmurar para não ser despedida; e, como a senhora tinha o hábito de deixar a chave no armário da copa, Pélicité tirava todas as noites uma pequena porção de açúcar, que comia sozinha, na cama, depois de ter feito as suas orações.

À tarde, por vezes, ela ia para defronte conversar com os postilhões.

A senhora ficava sempre em cima, nos seus aposentos.

Emma usava um roupão todo aberto que deixava ver, entre os rebuços do corpete, uma camisinha plissada, com três botões de ouro. O cinto era um cordão de grandes borlas e as chinelinhas cor de romã tinham um grande laço de fita larga, espalhada sobre o peito do pé. Comprara um mata-borrão, uma pasta, uma caneta e sobrescritos, embora não conhecesse ninguém a quem escrever; sacudia o pó da prateleira, olhava para o espelho, pegava num livro; depois, começando a sonhar no meio da leitura, deixava-o cair no regaço.





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