Tinha o desejo de viajar, ou então de voltar para o seu convento. Sentia, ao mesmo tempo, vontade de morrer e de morar em Paris.
Charles, expondo-se à chuva e à neve, cavalgava por caminhos e atalhos.
Comia fritadas às mesas das herdades, metia o braço dentro de camas húmidas, apanhava no rosto com o jacto morno das sangrias, ouvia pieiras, examinava bacias e pegava em muita roupa suja; mas encontrava, todas as noites, o fogo ateado, a mesa posta, móveis confortáveis e uma mulher com vestidos finos, encantadora, cheirando a frescura, não se percebendo mesmo donde provinha aquele odor, ou se não seria a sua pele que lhe perfumaria a camisa.
Emma encantava-o com as inúmeras delicadezas: ora se tratava de uma nova maneira de fazer arandelas de papel para as velas, um folho que mudava no vestido, ou o nome extraordinário de um prato muito simples que a criada estragara, mas que Charles se deleitava a engolir até ao fim. Viu em Ruão senhoras que usavam no relógio uma quantidade de berloques; comprou berloques. Quis ter em cima do fogão duas grandes jarras de vidro azul e, pouco tempo depois, um estojo de marfim com um dedal de prata dourada. Quanto menos Charles compreendia aquelas elegâncias, mais sentia a sua sedução. Acrescentavam alguma coisa mais ao prazer dos sentidos e à doçura do lar. Era como uma poeira de ouro que lhe cobria, em toda a extensão, o estreito caminho da vida.
Charles tinha boa saúde e um óptimo aspecto; a sua reputação estava definitivamente estabelecida. Os camponeses estimavam-no por não ser orgulhoso. Acariciava as crianças, nunca entrava na taberna e, além disso, inspirava confiança pela sua moralidade. Acertava sobretudo com os catarros e as doenças de peito. Tendo muito receio de matar os doentes, Charles, realmente, pouco mais receitava do que calmantes, de quando em quando um emético, um escalda-pés ou sanguessugas.