Miguel estava em calvos, e puxava pela saquita de missanga com gestos de troquilha de burros em feira:
- Aposto! Aqui está dinheiro! O fidalgo de quadros, o Sr. Tenente-coronel Cerveira lobo também diz que el-rei já por cá anda.
- O Cerveira lobo! Olha que borrachão! - disse o frade.
- Quem cá está é o rei dos bêbedos no corpo dele - acrescentou o morgado.
- Mas diz que o Sr. D. Miguel I gostava muito dele - objetou o pedreiro. – ouvi-o eu.
- Não duvido... - explicou o frade - que o Sr. D. Miguel gostava de grandes± patifes...
O primo Cristóvão redarguiu, magoado na sua esperteza, que era tão certo estar el-rei em calvos como era certo ter-me beijado a régia mão em casa do abade, na noite sempre memorável de 16 de Abril de 1845. Que só o tinha visto de relance em braga em 32, mas que o conhecera pelo retrato; que até manquejava um pouco, tal e qual, como se sabe, depois que a sua majestade quebrou a perna em 28. Que el-rei nomeara o abade de calvos seu capelão-mor, que dera a mitra de Coimbra ao abade de priscos, e fizera chantre o padre Manuel das agras, e a ele lhe fizera a mercê de duas comendas e o título de barão de Bouro, afora outras graças a diversos clérigos e leigos.
- Que te parece isto? - perguntou o morgado ao frade.
- Parece-me a notória estupidez do primo bezerra e mais dos padres; mas, se o homem que lá está é o D. Miguel, então o estúpido é ele, e que me perdoe sua majestade fidelíssima...
Escreveu-se novamente ao póvoas, ao tavares de fagilde e ao pontes, um colaborador da nação. Responderam - lhe que não havia tal D. Miguel em calvos; mas que deixasse correr o marfim, porque era necessário uma agitação preparatória, um simulacro, uma apalpadela...
- Quer dizer - reflexionou o frade - que o tal impostor é um batista, o precursor do verdadeiro messias.