Mas o que ocorreu de fato? Simplesmente isto: sua conceção foi mudada — sua conceção foi desnaturalizada; esse foi o preço que tiveram de pagar para mantê-lo. — Javé, o Deus da “justiça” — não está mais de acordo com Israel, não representa mais o egoísmo da nação; agora é apenas um Deus condicionado... A noção pública desse Deus agora se torna meramente uma arma nas mãos de agitadores clericais, que interpretam toda felicidade como recompensa e toda desgraça como punição em termos de obediência ou desobediência a Deus, em termos de “pecado”: a mais fraudulenta das interpretações imagináveis, através da qual a “ordem moral do mundo” é estabelecida e os conceitos fundamentais, “causa” e “efeito”, são colocados de ponta cabeça. Uma vez que o conceito de causa natural é varrido do mundo por doutrinas de recompensa e punição, algum tipo de causalidade inatural torna-se necessária: seguem-se disso todas as outras variedades de negação da natureza. Um Deus que ordena — no lugar de um Deus que ajuda, que dá conselhos, que no fundo é meramente um nome para cada feliz inspiração de coragem e autoconfiança...
A moral já não é mais um reflexo das condições que promovem vida sã e o crescimento de um povo; não é mais um instinto vital primário; em vez disso se tornou algo abstrato e oposto à vida — uma perversão dos fundamentos da fantasia, um “olhar maligno” contra todas as coisas. Que é a moral judaica? Que é a moral cristã? A sorte despida de sua inocência; a infelicidade contaminada com a ideia de “pecado”; o bem-estar considerado como um perigo, como uma “tentação”; um desarranjo fisiológico causado pelo veneno do remorso...