O que ocorreu? Simplesmente isto: os padres tinham formulado, de uma vez por todas e com a mais estrita meticulosidade, que tributos deveriam ser-lhe pagos, desde o maior até o menor (— não se esquecendo dos mais apetitosos cortes de carne, pois o padre é um grande consumidor de bifes); em suma, ele disse o que desejava ter, qual era a “vontade de Deus”... Desse tempo em diante as coisas se organizam de tal modo que o padre tornou-se indispensável em todos os lugares; em todos os importantes eventos naturais da vida, no nascimento, no casamento, na enfermidade, na morte, para não falar no “sacrifício” (ou seja, na ceia), o sacro-parasita se apresenta para os desnaturalizar — na sua linguagem, para os “santificar”... Pois é necessário salientar isto: que todo hábito natural, toda instituição natural (o Estado, a administração da Justiça, o casamento, os cuidados prestados aos doentes e pobres), tudo que é exigido pelo instinto vital, em suma, tudo que tem valor em si mesmo é reduzido a algo absolutamente imprestável e até transformado no oposto ao que é valoroso pelo o parasitismo dos padres (ou, se alguém preferir, pela “ordem moral do mundo”). O fato precisa de uma sanção — um poder para criar valores faz-se necessário, e tal poder só pode valorar através da negação da natureza... O padre deprecia e profana a natureza: esse é o preço para que possa existir. — A desobediência a Deus, ou seja, a desobediência ao padre, à lei, agora porta o nome de “pecado”; os meios prescritos para a “reconciliação com Deus” são, é claro, precisamente os que induzem mais eficientemente um indivíduo a sujeitar-se ao padre; apenas ele “salva”. Considerados psicologicamente, os “pecados” são indispensáveis em toda sociedade organizada sobre fundamentos eclesiásticos; são os únicos instrumentos confiáveis de poder; o padre vive do pecado; tem necessidade de que existam “pecadores”... Axioma Supremo: “Deus perdoa a todo aquele que faz penitência” — ou, em outras palavras, a todo aquele que se submete ao padre.