1984 - Cap. 7: Capítulo VII Pág. 81 / 309

No instante em que o desenrolou percebeu-lhe o valor. Era meia página arrancada do Times de uns dez anos antes - a parte superior, e incluía a data - e continha uma foto dos delegados numa função do Partido em Nova Iorque. No meio do grupo destacavam-se Jones, Aaronson e Rutherford. Impossível confundi-los; ademais, seus nomes constavam da legenda.

Isso não obstante, os homens tinham confessado, em ambos os julgamentos, que naquela data tinham estado em solo eurasiano. Tinham voado de um aeroporto secreto no Canadá a um ponto da Sibéria, onde conferenciaram com membros do Estado-maior Eurasiano, a quem haviam traído importantes segredos militares. A data gravara-se na mente de Winston porque era o dia do equinócio do verão; mas a história toda deveria estar registada numa porção de outros lugares. Só havia uma conclusão possível: as confissões eram falsas.

Naturalmente, isto em si não era nenhum descobrimento. Nem Winston imaginara que as pessoas suprimidas nos expurgos houvessem de fato cometido os crimes de que eram acusadas. Mas ali estava prova concreta; era um fragmento do passado abolido, como um osso de fóssil que surge numa camada errada e destrói uma teoria geológica. Seria suficiente para fazer o Partido tremer, se fosse possível publicá-la e tornar conhecido do mundo o seu significado.

Ele continuara trabalhando. Assim que vira a fotografia, e o que queria dizer, cobrira-a com uma folha de papel. Por sorte, ao desenrolá-la, estava de cabeça para baixo, em relação à teletela.

Colocou no joelho o bloco de rascunho e empurrou a cadeira para trás, de modo a se afastar o mais possível da teletela. Manter o rosto sem expressão não era difícil, e com esforço se podia até controlar a respiração: mas não era possível controlar o bater do coração, e a teletela era bastante sensível para captá-lo.





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