- Como vai ele viver em Paris?... conseguirá acostumar-se?
A Sr. Bovary suspirou.
- Ora, ora! - disse o farmacêutico, dando um estalinho com a língua. - Os bons petiscos nos restaurantes, os bailes de máscaras, o champanhe! tudo isso vai ajudar, garanto-lhe.
- Não creio que corra muito atrás dessas coisas - objectou o Dr. Bovary.
- Nem eu! - apressou-se a responder Homais. - Apesar de que terá de fazer um pouco como os outros, para não se arriscar a passar por jesuíta, não faz uma ideia da vida que levam esses farsantes lá no Bairro Latino com as actrizes! E também os estudantes são muito apreciados em Paris desde que saibam agradar, recebem-nos nas melhores sociedades, e há até amas do subúrbio de Saint-Germain que se apaixonam por eles, o que lhes permite, como resultado, fazerem bons casamentos.
- Mas - disse o médico - tenho um certo receio que... por lá...
- Tem razão - interrompeu o boticário -, há o reverso da medalha! É preciso andar sempre com a mão a segurar a carteira. Em Paris, por exemplo, está-se num jardim público e aparece um fulano, muito apresentável, condecorado até, que se poderia tomar por um diplomata; apresenta-se, estabelece-se a conversação; ele insinua-se, oferece uma pitada, apanha-nos o chapéu que caiu. A gente toma mais confiança, ele leva-nos ao café, convida-nos a ir à sua casa de campo, entre dois cálices apresenta-nos a uma quantidade de pessoas e, durante três quartas partes do tempo, não faz senão explorar-nos a bolsa ou levar-nos a dar passos perniciosos.
- Isso é verdade - respondeu Charles -, mas estava a pensar principalmente nas doenças, na febre tifóide, por exemplo, que ataca os estudantes da província.
Emma estremeceu.
- Devido à mudança de regime - continuou o farmacêutico - e à perturbação que daí resulta para todo o organismo.