A partir de então, aquela recordação de Léon tornou-se o centro do seu tédio. Nele crepitava com mais força do que, numa estepe russa, uma fogueira de viajantes abandonada na neve. Emma corria para ela, chegava-se-lhe tão perto quanto podia, remexia delicadamente aquela fogueira quase a extinguir-se, ia buscar por toda a parte ao seu redor tudo o que pudesse avivá-la mais; e as longínquas reminiscências, do mesmo modo que as oportunidades mais recentes; aquilo que sentia, juntamente com o que imaginava; os seus desejos de volúpia que se dispersavam, os projectos de felicidade que estalavam ao vento como ramos secos, a sua virtude inútil, as esperanças desvanecidas, as tarefas domésticas, tudo juntava, tudo apanhava, e tudo servia para lhe aquecer a tristeza.
Entretanto, as chamas aplacaram-se, ou porque as reservas por si mesmas se exaurissem, ou porque o amontoamento fosse demasiado grande. O amor extinguiu-se, pouco a pouco, pela ausência e a saudade foi sufocada pelo hábito; aquele clarão de incêndio que lhe tingia de púrpura o céu pálido cobriu-se de mais sombras e extinguiu-se gradualmente. No meio do entorpecimento da sua consciência, chegou ela a tomar as repugnâncias pelo marido como aspirações pelo amante, os ardores do ódio como renovações de ternura; mas, como o furacão continuava a soprar e a paixão se consumiu até às cinzas, e não chegou qualquer auxílio, e nenhum sol apareceu, por todos os lados se fez noite cerrada e ela ficou perdida no
meio de um horrível frio que a trespassava.
Recomeçaram então os maus dias de Tostes. Sentia-se agora muito mais infeliz, pois tinha a experiência do desgosto, com a certeza de que não teria fim.
Uma mulher que tantos sacrifícios impusera a si mesma poderia muito bem dispensar.