Vendo Emma, pareceu aliviado de um grande peso e, entabulando imediatamente a conversação, disse
- Não faz calor nenhum, está um frio que corta! Emma não respondeu. Ele continuou
- E a senhora a sair assim tão cedo?
- É verdade - balbuciou ela. - Venho de casa da ama onde está a minha filha.
- Ah!, perfeitamente, perfeitamente! Pois eu, tal como me vê, estou aqui desde madrugada; mas o tempo está tão enevoado que, a não ser que me venham parar as penas mesmo à boca do cano...
- Passe muito bem, Sr. Binet - interrompeu ela, voltando-lhe as costas.
- Às suas ordens - replicou ele secamente. E voltou a enfiar-se no barril.
Emma arrependeu-se de ter deixado assim tão bruscamente o tesoureiro. Ele iria sem dúvida fazer conjecturas desfavoráveis. A história da ama era a pior desculpa, porque toda a gente sabia em Yonville que a pequenita dos Bovary há um ano já que voltara para casa dos pais. Além disso, não morava ninguém por ali perto e aquele caminho só dava passagem para a Huchette; portanto, Binet calculara donde ela vinha e não se calaria, daria à língua, era mais que certo!
Emma ficou até à noite a torturar o espírito com todos os projectos de mentiras imagináveis, vendo sempre na sua frente aquele caçador imbecil.
Charles, depois do jantar, vendo-a inquieta, quis levá-la a casa do farmacêutico para a distrair; e a primeira pessoa com quem Emma encarou na farmácia logo haveria de ser ele, o tesoureiro! Estava de pé, diante do balcão, iluminado pela luz da redoma vermelha, e dizia
- Dê-me, por favor, meia onça de vitríolo.
- Justin - gritou o boticário -, traz-me o ácido sulfúrico!
Depois, voltando-se para Emma, que queria subir ao quarto da Sr. Hormais
- Não, pode esperar, não vale a pena, ela desce já.