Depois foi direito ao aprendiz e, postando-se-lhe na frente, com os braços cruzados:
- Mas tu tens então os vícios todos, meu infeliz?... Toma cuidado, que estás à beira de um abismo!... Nem sequer reflectiste que este livro infame podia ir parar às mãos dos meus filhos, acender-lhes uma faísca no cérebro, manchar a pureza de Athalie, corromper Napoléon! Ele já tem atitudes de homem. Tens ao menos a certeza de que não o leu? Podes-me garantir ..?
- Mas, afinal, Sr. Homais - disse Emma -, tinha uma coisa para me dizer?
- É verdade, senhora... O seu sogro morreu!
Efectivamente, o pai do Dr. Bovary falecera na antevéspera, repentinamente, com um ataque de apoplexia, ao levantar-se da mesa; e, por excesso de precaução para com a sensibilidade de Emma, Charles pedira a Homais que fosse ele a dar-lhe, suavemente, a horrível notícia.
Homais meditara na frase, arredondara-a, polira-a, ritmara-a; era uma obra-prima de prudência e de transições, de finura e delicadeza; mas a cólera suplantara a retórica.
Emma, renunciando a obter qualquer pormenor, deixou então a farmácia, pois o Sr. Homais recomeçara a sua série de impropérios. Acalmava-se entretanto e, por fim, apenas resmungava em tom paternal, abanando-se ao mesmo tempo com o barrete grego.
- Não é que eu desaprove inteiramente o livro! O autor era médico.
Contém certos aspectos científicos que não fica mal a nenhum homem conhecer, e sou até de opinião de que os deve conhecer. Mas mais tarde, mais tarde! Espera, pelo menos, que tu próprio sejas já homem e que a tua constituição física esteja forjada.
À primeira pancada de Emma na aldraba, Charles, que a esperava, avançou para ela de braços abertos, dizendo-lhe com lágrimas na voz:
- Oh, minha querida amiguinha.