Essa carta entregar-ma-ás amanhã pela manhã, e serei eu o próprio que hei de fazê-la chegar às suas mãos; desta maneira creio que há de ter uma resposta, e por ela avaliaremos quais são as suas tenções futuras e qual o estado do seu coração ao teu respeito.
- Mas tu na verdade desejas ser o portador?...
- E que há nisso de extraordinário? Faz o que te aconselho e deixa correr o mais pela minha conta.
- Continuarei, pois, a obedecer-te: amanhã às oito horas aparece para te entregar a carta, e que Deus te agradeça os sacrifícios que fazes por mim.
Separaram-se, e, no dia seguinte, à hora aprazada, Rosa entregou-lhe a carta.
António dirigiu-se em seguida a sua casa, procurou seu amo e falou-lhe nestes termos:
- Sr. Padre Francisco, vinha pedir-lhe consentimento para me deixar ir hoje ao Porto.
- Ao Porto, para quê?!
- Para entregar esta carta à pessoa a quem vai dirigida - e mostrou-lhe o sobrescrito da missiva de Rosa.
- Essa carta é?
- De Rosa.
- Ah! já percebo: constituíste-te em parlamentário entre duas nações beligerantes.
- As circunstâncias que se têm dado obrigam-me a fazer tudo quanto possa para vê-los ambos felizes.
- Anda lá, António, anda lá; sei que és um rapaz de tino e por isso não me oponho aos teus desejos. Mais tarde talvez saibas o bem que fazes, empenhando-te pelo futuro dessa pobre rapariga... Quando quiseres, podes partir e escolhe uma das melhores carruagens da cavalariça, para ires mais depressa.
- Obrigado, Sr. Padre Francisco; e, visto dar-me licença, parto ao anoitecer, para voltar ainda esta noite e não tornar a minha ausência notada pelos outros rapazes, que decerto não descansariam enquanto não soubessem onde fui.
À noite, António desceu à cavalariça, aparelhou ele próprio uma das éguas que ali estavam e, saindo sem ser visto pela gente da casa, pôs-se a caminho para a estrada real que conduzia ao Porto, que depois seguiu a trote cerrado.