As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 16: XVI Pág. 107 / 332

Podem passar ignoradas de todos as peripécias desse combate íntimo; mas a aparente tranquilidade exterior mais lhe exacerbará a crueza.

Margarida escutou por muito tempo a irmã, sem saber como acolher aquelas ingénuas confidências; afinal lembrou-lhe, sorrindo, que devia ser menos sensível à opinião de estranhos quem, dentro em tão pouco tempo, ia ligar o seu destino ao destino doutro.

Clara possuía um génio, com o qual se não davam as apreensões.

Não calculava consequências. A vida para ela era o presente.

Raras vezes lhe lembrava o passado: o futuro não lhe tomava muitos momentos de meditação também. As palavras e os actos irreflectidos eram nela frequentes. De nada suspeitava. A sua confiança em todos e em tudo chegava a ser perigosa. Um inesgotável fundo de generosidade, elemento principal daquele carácter simpático, levava-a ao cepticismo em relação à malevolência e à má-fé que outros possuíssem. Parecia muitas vezes afrontar a opinião do mundo e não era por a desprezar, mas porque não pensava nela.

Quem possui um carácter assim, se se não perde, se se não perde inocentemente, é porque tem a defendê-lo a Providência, porque o abrigam as asas do seu anjo da guarda.

Ouvindo pois a observação da irmã, Clara desatou a rir.

- Que me estás aí a dizer, Guida? que me estás tu aí a dizer?

Então, por eu me casar, devo deixar de fazer gosto de mim? Olha, eu não me quero com gente muito sisuda. A ti perdoo-te, porque...

enfim... és muito boa também, mas, ainda assim, não perdias se...

- E, mudando subitamente de tom, acrescentou com um pouco de malícia na voz e no olhar:

- Ora Diz-me cá uma coisa, Guida, com toda essa tua seriedade, não gostarias também que um rapaz, assim como Daniel, dissesse de ti o mesmo? Anda, confessa.





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