XXI Cumprindo a promessa, que tinha feito a Joana, foi o novo clínico fazer a sua segunda visita.
O leitor deve estar lembrado de que o doente era o nosso já conhecido João da Esquina, ou, pelo menos, alguém da sua respeitável família.
Ao apresentar-se em lugar de João Semana, Daniel foi recebido com uma visagem, pouco lisonjeira, do dono da casa, impressionado ainda talvez com as revolucionárias, e em nada tranquilizadoras, opiniões médicas, que conhecia no seu vizinho.
- Então como é isto? É o senhor que vem?... - dizia o homem, meio desconfiado, e como hesitante em entregar-se aos cuidados da medicina nova.
- É verdade; sou eu - respondeu-lhe Daniel. - O João Semana não podia hoje vir para estes sítios e, como lhe lembrou que talvez fosse de pressa a doença...
Um sorriso encrespou os lábios do tendeiro.
- A doença?! Ah!... Então nós sempre temos doenças?! - perguntou o Sr. João da Esquina, com certo ar de finura triunfante.
- Pois que dúvida? - disse Daniel muito longe de suspeitar o sentido oculto da interrogação. - Não mandou chamar um médico?
É provável que não seja para o consultar sobre alguma demanda.
João da Esquina meneava a cabeça com ar de satisfação.
- Portanto segue-se que temos doenças? Bem, bem.
- Mal, mal - emendou Daniel, sorrindo.
- Eu cá me entendo. Afinal há-de vir para o bom caminho, e no mais também; se Deus quiser.
- No mais? - repetia Daniel, sem entender o anfiguri.
- No mais, sim, no mais. Ora diga-me - continuou ele, tomando Daniel de parte e falando-lhe quase ao ouvido – parece-lhe que eu sou algum macaco?
O filho de José das Dornas olhou espantado para o seu interlocutor, e principiou a suspeitar que a moléstia, que exigia os cuidados do médico, era desarranjo intelectual.