Madame Bovary - Cap. 33: X Pág. 368 / 382

Ouviu-se o ruído seco de um pau ferrado batendo compassadamente o chão de lajes. O ruído vinha do fundo e deteve-se repentinamente numa das naves laterais da igreja. Um homem de grossa jaqueta escura ajoelhou-se com muita dificuldade. Era Hippolyte, o moço do Leão de Ouro. Pusera a sua perna nova.

Um dos chantres veio dar a volta à igreja para fazer a colecta, e as grandes moedas começaram a tinir, umas atrás das outras, na salva de prata.

- Despachem-se lá com isso! Estou farto de sofrer! - exclamou Bovary, atirando-lhe furioso uma moeda de cinco francos para a bandeja.

O homem da igreja agradeceu-lhe com uma grande vénia. Cantavam, ajoelhavam-se, tornavam a levantar-se e aquilo nunca mais acabava! Lembrou-se de que uma vez, nos primeiros tempos, tinham assistido juntos a uma missa e se haviam colocado do lado oposto, à direita, encostados à parede. O sino recomeçou a dobrar. Houve um grande movimentar de cadeiras. Os cangalheiros passaram os seus três paus por baixo do caixão e as pessoas saíram da igreja.

Justin apareceu então à porta da farmácia, mas voltou logo depressa para dentro, pálido, a cambalear.

Havia gente às janelas para ver passar o cortejo. Charles, à frente, seguia curvado. Mostrava-se corajoso e cumprimentava com um gesto aqueles que, saindo das ruelas ou das portas, se juntavam à multidão.

Os seis homens, três de cada lado, caminhavam a passos curtos, um tanto ofegantes. Os padres, os chantres e os dois meninos do coro recitavam o De profundis; as suas vozes espalhavam-se no campo, subindo e descendo com ondulações. Por vezes desapareciam nas curvas do caminho. Mas a grande cruz de prata via-se sempre erguida por entre as árvores.

Seguiam-se as mulheres de capas pretas e capuzes na cabeça; levavam na mão uma grande tocha acesa, e Charles sentia-se desfalecer com aquela contínua repetição de orações e de luzes, com os insípidos cheiros da cera e das batinas.





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