Madame Bovary - Cap. 7: VII Pág. 51 / 382

Que estariam elas fazendo agora? Na cidade, com o ruído das ruas, o rumor dos teatros e a iluminação dos bailes, levavam uma existência em que o coração se dilata e os sentidos desabrocham. Mas ela, a sua vida era fria como um sótão com a lucarna voltada para o norte, e o tédio, qual aranha silenciosa, tecia-lhe à sombra a sua teia em todos os cantos do coração. Lemorava-se dos dias de distribuição de prémios, em que subia ao estrado para ir buscar as suas pequenas recompensas. Com os cabelos entrançados, de vestido branco e sapatos pretos decotados, tinha um modo gentil, e os cavalheiros, quando ela voltava a sentar-se, inclinavam-se para lhe dirigir elogios; o pátio estava cheio de caleches, diziam-lhe adeus pelas portinhoas, o mestre da música passava fazendo cortesias com a caixa do seu violino na mão. Como já ia longe tudo aquilo! Como ia já tão longe!

Chamava por Djali, prendia-a entre os joelhos, passava-lhe os dedos pela cabeça fina e longa e dizia-lhe: «Vamos, beija a tua dona, tu que não ens nenhum desgosto.»

Depois, observando a expressão melancólica do elegante animal, que bocejava lentamente, enternecia-se e, comparando-o a si mesma, falava-lhe em voz alta, como a alguém aflito a quem se consola.

Vinham por vezes rajadas de vento, brisas do mar que, rolando com ímpeto sobre todo o planalto da região de Caux, traziam, até aos campos do interior, uma frescura salgada. Os juncos sibilavam junto ao chão e as folhas das faias rumorejavam num rápido frémito, enquanto os cimos, balo içando sempre, continuavam a seu longo murmúrio. Emma apertava o xaile contra os ombros e levantava-se.

Na avenida, uma luz verde coada pela folhagem iluminava o musgo rasteiro que lhe estalava brandamente debaixo dos pés.





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