As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 35: XXXV Pág. 253 / 332

- Tu!

- Sim, fui eu. Não lho poderia eu dar? - acrescentou Margarida, quase sorrindo e afastando os cabelos desordenados, que cobriam a fronte da irmã.

- Entendo. Perdeste-te para me salvar. Limpaste com os teus vestidos a lama dos meus, para me apresentares pura aos olhos do meu noivo, que com razão me supunha culpada! Entendo. Viste-me perdida, e fizeste como aquela criança que, há tempos, se afogou para livrar um irmão da corrente; salvaste-me, mas afundando-te.

E havia eu de consentir isto, Margarida? Tão má ideia fazias tu de mim, para imaginares que eu te aceitaria nunca o sacrifício? Ó Guida, de mim aceitarias tu sacrifício igual? Não: quero que o Pedro saiba tudo; que me perdoe ou que me despreze depois; a uma ou outra coisa me sujeitarei; mas a sacudir sobre a tua cabeça a vergonha que chamei sobre mim, oh! isso...

Margarida tomou-lhe afectuosamente as mãos e, em tom persuasivo, pôs-se a dizer-lhe:

- Ora escuta, Clarinha. Hás-de primeiro ouvir-me com muito sossego e muito juízo, e depois dirás se eu tenho razão. Queres contar a verdade a Pedro, dizes tu. Que fazes com isso? Torná-lo infeliz, fazes com que entre ele e o irmão exista sempre, daí por diante, motivo para aversão; e a ti, que amas Pedro, apesar de uma leviandade de momentos, e a mim, que te amo, e a nós ambos e a todos vais fazer infelizes. Eu que posso perder em que Pedro continue na mesma suspeita? Se ninguém mais a tem? - forçou-se ela a dizer, mas baixando os olhos, porque bem sabia que mentia. - Ele não é capaz de a divulgar. E depois, olha, Clarinha, quem nunca pensou em grandes futuros, não tem que ter saudades de projectos desfeitos.

Eu já não formo projectos, há muito; acredita. Cansei-me. Hoje recebo tudo da mesma maneira.





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